domingo, maio 30, 2004

If you're feeling sinister

Oh! Get me away from here, I'm dying! (B&S)
Li isso na parede de uma lanchonete. Provavelmente um fã de Belle&Sebastian desesperado com um spray na mão. Poluição visual, vandalismo e outros adjetivos negativos que comumente vêm à minha cabeça quando vejo uma pixação, não passaram nem perto dos meus pensamentos. Pensei apenas na melodia e comecei a cantarolar e lembrar dá época em que o disco e essa música não paravam de tocar em casa.
Minha companheira das horas difíceis, "Get me away from here, I'm dying" foi o hit dos meses de janeiro a maio de 2003.
Contei minhas melhores pidadas nesse período, inventei quatrocentas formas de esconder o choro e entendi, finalmente, o sentido de estender roupas em Macondo. Entendi porque gostava tanto da possibilidade de sumir de pregador na mão.*
Fiquei, então, imaginando os motivos do cara para sair enlouquecido com um spray na mão para escrever esse verso. Por instantes fui solidária para com alguém que nem sei quem é. Não discuto a pixação, sou contra, mas um pixador comum não escreve em parede de lanchonete meia boca, uma frase em inglês e ainda dá os créditos da banda.
Acho que o que me impediu de fazer o mesmo, na época, foram os pregadores e os promotores que a todo momento questionam a tal da minha liberdade condicional.


* No livro "Cem Anos de Solidão" há uma parte sobre uma mulher que desaparece estendendo roupas. Dou o apelido carinhoso de Macondo ao bairro onde moro e se vc leu ou ler o post linkado nesse texto, entederá a comparação. Na época não dei os créditos por pura preguiça.

OS OMBROS SUPORTAM O MUNDO
(Carlos Drummont de Andrade)

Chega um tempo em que não se diz mais: meu
Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos
edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação


sábado, maio 29, 2004

Dos autores e das obras

Raramente eu associo autor e obra. Talvez seja um defeito meu, mas ainda que eu goste muito de um determinado autor, sua vida não me interessa em nada. Gosto de saber da vida quando tem alguma relação com sua obra, caso contrário, não faço a menor qüestão.
Com exceção de Mário de Andrade, que devo confessar, gosto mais da figura dele do que de seus poemas, se Borges era de direita, se Nelson Rodrigues machista, ou mesmo se Dostoiévski escrevia para pagar dívidas de jogo, nada disso faz diferença para mim. Gosto do que eles escrevem, gosto do texto, a vida pessoal não me interessa.
Aliás, até com o Mário, isso acontece. Apesar de ser capaz de fazer o caminho do 35, conto "Primeiro de Maio" e adorar ler suas correspondências, coisas como sua sexualidade, motivo da briga com Oswald, relação com Anita são totalmente descartáveis, aos meus olhos, porque não interferem diretamente em sua obra. A briga com Oswald interferiu um pouco no seu trabalho crítico, mas o motivo em si, não.
Com bandas acontece a mesma coisa. O Pedrinho que vive fazendo gracinhas por eu gostar de Belle&Sebastian deve saber mais da banda que eu. Não sei nomes de cor, não sei fatos, acho que não sei quase nada, apesar de ter todos os discos.
Até Maria Bethânia e Chico Buarque que são meus deuses da música, eu raramente procuro saber algo sobre suas vidas. Aliás, quanto mais distante dela, melhor. Sei lá, deuses não devem virar gente, ganhar características humanas como os da Grécia, porque a crueldade é uma dessas características.
Eu sempre insisto na diferença entre autor/narrador, poeta/eu lírico, personagem/pessoa, porque uma obra literária ou uma música, ainda que haja elementos autobiográficos, passam pelo processo de criação, são transformados, e esse é o grande barato da escrita, do contar estórias, ou da melodia e harmonia de uma música. Aquela velha história do "não é o que se diz, mas como se diz". E, volto a repetir a frase do filme Storytelling: "não importa se é verdade ou não, se está escrito é ficção".
Pode ser defeito querer ficar longe da vida pessoal, mas isso também me faz ser menos decepcionada, até mesmo ao conhecer pessoas via blog, que raramente são o que seus sites aparentam. Dessa forma, consigo não esperar nada de um escritor quando o conheço pessoalmente, ou de um autor de um blog - o que raramente acontece, pois até hoje, só conheci duas pessoas via blog e, posso dizer com certeza, não eram nada parecidas com "suas personagens" virtuais.

quinta-feira, maio 27, 2004

As Dedicatórias

Eu sou uma profunda apreciadora de dedicatórias. Há alguns autores que, na minha opinião, deveriam dedicar a vida escrevendo dedicatórias. Um exemplo é Fernanda Young, afinal, quase todas as pessoas que conheço citam como uma das melhores coisas que a moça já escreveu aquela parte em que ela oculta o beneficiário e o motivo, dizendo apenas: "para você, por aquele dia".
Outra maravilhosa é de Gabriel García Márquez no livro "El amor en los tiempos del cólera". É de uma classe o modo com que ele alega a obviedade daquela dedicatória, como se todos os seus leitores tivessem por obrigação saber que seria " para Mercedes, por supuesto".
Quem é Mercedes não importa, porque o leitor não precisa saber, exceto os que têm fixação por biografias, contudo, tem a obrigação de saber que só poderia ser para ela, aquele livro que fala de amor de um jeito tão bonito e é considerado, por um grande amigo meu, seu romance de amor favorito. Tudo bem que eu nunca consigo lembrar-me de outro quando quero ser "do contra", mas essa dedicatória é, sem dúvida, a mais bela declaração de amor que já li. Só que, já diria Machado, não vale um beijo.
Falando em Machado, é dele, ou melhor, de sua personagem Brás Cubas, a mais incrível de todas:

"Ao verme
que
primeiro roeu as frias carnes
do meu cadáver
dedico
como saudosa lembrança
estas
Memórias Póstumas"

Nada mais inteligente que dedicar um livro ao verme, mesmo porque esse é o destino de quem o escreveu, de quem o lê e, do jeito que as coisas andam no mundo, de todo e qualquer livro que possa ser escrito.

quarta-feira, maio 26, 2004

Esperança ou o mundo através do olhar de Miss Brill*


A esperança é um bichinho peludo e traiçoeiro. Quando o encontramos, somos tomados por uma felicidade de suco instantâneo. Quase não cabemos em nós mesmos tamanha a vontade de espalhar para os quatro cantos que fazemos parte de um admirável espetáculo em que cada ator, cada fala e cada situação fazem sentido.
Mas é só pegarmos o bichinho na mão que ele nos morde e lembramos que o suco é artificial, a peça não tem diretor e as falas foram escritas por um dramaturgo de quinta.


*Srta Brill é um conto de Katherine Mansfield, escritora nascida na Nova Zelândia em 1888, falecida em 1923, que se espacializou na difícil arte do conto. Entre suas admiradoras mais famosas estão Clarice Lispector e Ana Cristina Cesar. Vale conferir esse belo conto. Infelizmente não achei um link em português, mas se você não lê em inglês e também não achou o conto em português, pode pedir que eu terei um prazer enorme em enviar. Se quiser conhecer outro conto, há a tradução de "Bliss" no site releituras, mas no momento estou com preguiça de procurar o link.

domingo, maio 23, 2004

Achocolatado

Os termômetros marcavam dez graus e a neblina cobria essa cidade que já é cinza por natureza. Ainda assim resolvi sair, não aguentava mais ficar prostrada diante da TV, zapeando. Precisava de gente e de ficção. Decidi ir ao cinema.
O frio parecia emudecer as pessoas e as impedia de sorrir. Durante o caminho, percebia a imagem do meu rosto refletida nas vitrines das lojas já fechadas. Era um rosto acinzentado e de espera. Eu me vi parecida com uma velha professora que conheci há quinze anos atrás. Ela usava óculos que ocupavam muito mais que a área dos olhos, seu corte de cabelo lembrava as francesinhas da década de 30 e seu rosto era acinzentado e de espera.
Apesar da delicadeza da película, não saí tocada como gostaria. O frio tocava-me muito mais naquele momento e por isso resolvi passar num supermercado para comprar achocolatado, antes de voltar para casa.
Já com achocolatado na bolsa, seguia rumo à estação de metrô quando fui surpreendida por uma voz:
- De onde você está vindo, menina?
Era ele, só podia ser, reconheceria aquela voz ainda que não a ouvisse por décadas, fora o hábito de chamar-me de menina, apesar de termos a mesma idade, apenas alguns meses de diferença. Olhei para trás e tive a confirmação. Estava acompanhado por uma garota que deveria ter no máximo 20 anos.
Fiquei parada sem conseguir dizer uma palavra. Estava paralisada olhando o casal.
Novamente ele perguntou:
- De onde você está vindo, menina?
- Do mercado, fui comprar achoco... - não consegui terminar a frase; um alarme tocou no meu cérebro e denunciou a grande bobagem que eu estava dizendo.
Ele, é claro, não perderia a piada por nada e logo disse:
- Nossa, precisava vir do outro lado da cidade para comprar um achocolatado?
A garota, sem entender, perguntou:
- Como assim, onde ela mora?
Fiquei completamente atordoada ao ver a expressão da moça quando ele respondeu sua pergunta. Ela olhou-me como quem fosse dizer: "você é maluca, sair nesse frio só para comprar achocolatado e num supermercado tão longe da sua casa? "
Já tinha levado a fama, resolvi deixar o constrangimento de lado e respondi:
- Pois é, eu sou viciada em a achocolatado, não posso ficar nenhum segundo sem. Mas tem que ser o de uma marca específica e não tinha perto de casa, nem por todos os supermecados no caminho até aqui. Ainda bem que encontrei , minhas crises de abstinência são terríveis. Quase matei meu irmão, da última vez e cheguei a ferir, gravemente, meu cachorro.
A moça ficou assustada, parecia realmente acreditar que eu seria capaz de matar se ficasse sem achocolatado. Ele, porém, percebeu a brincadeira e sorria como no tempo em que estávamos juntos. Por instantes nos olhamos como se estivéssemos lembrando dos mesmos momentos, como se perguntássemos: "por quê"?
A mão de sua acompanhante entrelaçando a dele, indicando que pretendia ir embora, respondeu nossa pergunta. Constrangido, despediu-se de mim friamente e foi embora com ela.
Eu continuei em direção ao metrô, caminhando com a mesma lentidão e timidez da lágrima que caia sobre meu rosto que já não esperava mais nada...

sábado, maio 22, 2004

Salve! Salve, simpatia!

Ao observar seus amigos mais próximos, já notou que há peculiaridades em cada um deles que são completamente impossíveis de explicar, que o deixam com vontade de vomitar, que o irritam absurdamente, mas que é exatamente isso que o faz gostar deles?
Um exemplo disso é a simpatia de E. C. e Adriana. Parece estar escrito em seus rostos: "aproxime-se".
E. C. é a pessoa mais devagar do mundo. Está sempre atrasado, porque, na maioria das vezes, esquece que marcou algo com você. Coisas que deixariam qualquer pessoa sem querer falar com ele por anos, mas é só chegar para tomar satisfações e deparar-se com um sorriso de quem não tem a mínima idéia do que você está falando, conta uma novidade qualquer e o faz esquecer na hora o porquê de estar bravo com ele. Afinal, percebe que ele realmente não sabia do que você estava falando, porque havia esquecido.
Só que a pior parte dos seus atrasos é se você vai buscá-lo em sua casa. Além de ficar esperando horas para que ele crie coragem de sair, o Sr. Simpatia pára e conversa com cada pessoa que o cumprimenta. Detalhe: é daqueles que se alguém pergunta, "tudo bem"? - ele vai explicar porque está tudo bem e o mais incrível é que essa é uma descrição típica de um "chato", mas ao contrário do que se espera, qualquer pessoa começa a se interessar, milagrosamente, por seu relato. Vai tentar isso, você, caro leitor, e ninguém jamais perguntará se está tudo bem, aliás, fugirão ao vê-lo num raio de dois quilômetros. Com E. C., não. Todos os seres humanos que cruzam por ele abrem um sorriso e param para conversar.
Com Adriana acontece a mesma coisa. Ela tem apenas um metro e meio de altura é percebida em todos lugares por onde passa, ainda que esteja numa distância quilométrica. Qualquer lugar onde entra, ouve-se alguém gritando: "Dri!" Chega ser enjoativo.
Pior ainda é aquele maldito celular que não pára de tocar um minuto. É só começar uma conversa e ela é interrompida, ou pelo toque do celular, ou por alguém gritando seu nome. Chega ser impossível conversar com ela mais de dez minutos, sem ser interrompido. Assim como E. C., demoram séculos para chegar onde se propuseram ir. Vão encontrando uma série de pessoas no caminho e o pobre coitado que os espera vai preparado para passar horas fazendo carão.
É incrível como apesar de coisas desse tipo serem extremamente irritantes em qualquer outro ser-humano, nos dois tornam-se peculiaridades fascinantes. Qualquer dessas pessoas que os param, fazendo-os se atrasarem, que interrompem suas conversas, também passam pelas mesmas situações dos que os esperam e são interrompidos. No entanto, ninguém deixa de procurá-los.
Mas vá tentar ser simpático como eles... seu celular não tocará, a não ser quando sua mãe liga ou em caso de engano, e ficará mais sábados à noite sozinho em casa, mesmo sendo bissexual e como disse Woody Allen, tendo 50% a mais de chance de não ficar.

quinta-feira, maio 20, 2004

A meu Pai doente

Para onde fores, Pai, para onde fores,
Irei também, trilhando as mesmas ruas.
Tu, para amenizar as dores tuas, Eu, para amenizar as minhas dores!
Que cousa triste! O campo tão sem flores,
E eu tão sem crença e as árvores tão nuas
E tu, gemendo, e o horror de nossas duas
Mágoas crescendo e se fazendo horrores!
Magoaram-te, meu Pai?!
Que mão sombria,
Indiferente aos mil tormentos teus/
De assim magoar-te sem pesar havia?!
? Seria a mão de Deus?!
Mas Deus enfim, é bom, é justo, e sendo justo, Deus,
Deus não havia de magoar-te assim!


Manuel Bandeira.


quarta-feira, maio 19, 2004

O olho de Miguilim

Tá, eu sei que isso aqui virou "o diário da donzela pós-moderna, pós pós modernidade". Mas tenham paciência com essa quase Balzaquiana que está em plena transformação do olhar.
Minhas vistas estão cansadas e quando fico de castigo, não tenho tempo para brincar de pensar.
Tenho colocado os óculos mais vezes do que de costume. Comecei a usá-los aos dois anos de idade, mas sempre dava um jeito de tirá-los em alguns momentos do dia, quando ver tudo com clareza me fazia mal. O problema é que mais gente, além do oftalmo, começou a reclamar da ausência dos óculos em meu rosto. Gritam e como castigo me obrigam a colocá-los, ao contrário de antigamente que me deixavam num cantinho da casa, quietinha. Era bom; brincava de pensar, pensava no pensar e não falava com ninguém. Podia ter a certeza de que minha tagarelice não estava incomodando. Até minha eterna "leve impressão de que já vou tarde" sumia e eu podia ficar comigo mesma. É bom estar só comigo.
Hoje em dia não posso mais desfrutar de minha companhia, a todo momento me chamam e eu tenho que estar de óculos. Repetem o tempo inteiro que preciso enxergar direito.
Ora! O embaçar das coisas, o vulto e a sombra alimentam meus pensamentos. Posso emprestar formas muito mais interessantes às coisas. Mas ninguém entende isso por conta dos famigerados 30 anos que batem à porta. Estou pensando, seriamente, em não atender.

sábado, maio 15, 2004

A quem interessar possa...

Hoje é aniversário de alguém tão especial para mim que me sinto com vergonha de não cuidar dessa amizade como deveria. Às vezes vislumbro-me com outras pessoas que, embora façam parte da minha vida, não ocupam um espaço tão grande em meu coração como esse meu amigo.
É bom quando o encontro nos corredores, porque me sinto em casa. Aquele lugar já não faz parte de mim, mas quando o encontro, sinto que voltei ao primeiro ano, quando tudo era festa, eu amava literatura e achava que queria passar o resto da vida ensinando as pessoas a gostarem de ler, escrever e, pensava, sobretudo, que seria uma grande escritora algum dia.
Eu deveria colocar o link do fotolog de sua banda, eu deveria escrever em camisetas "I love Rô", eu deveria fazer um tratado filosóficos sobre os vocábulos "filé", "chinelar" e "babe".
Nunca fiz nada disso. Mas deveria ter feito, deveria...

***


Ontem, sozinha no elevador, pensei em tudo isso. Subi pelas ruas desertas em que só se ouvia um triste samba canção e só se podia perceber uns poucos. Voltei me achando estranha e cheguei em casa preparada para o susto. Estava tudo igual, exceto pelo fato de que meu pai não agonizava de frio, não queria se cobrir e não me reconhecia.
Chegar em casa é estar preparada para o susto, mas nunca o preparo consegue amenizar a dor. Preparei-me para morte, mas não para vida.
Tenho me sentido sem casa, sem que ninguém consiga reconhecer-me de fato. Já diria Ana C., "não consigo passar minha ternura, minha ternura, entende?"

***


'Não sei, mas esse tal de
yogurte, às vezes, me faz lembrar o poema do Drummond:"Anedota Búlgara".

Era uma vez um czar naturalista
que caçava homens
Quando lhe disseram que também se caçam borboletas e andorinhas
ficou muito espantado
e achou uma barbaridade.


Quando meu cachorro Au Pacino finalmente aprender a teclar, não vou deixá-lo entrar lá não.

terça-feira, maio 11, 2004

Falando demais

Outro dia uma amiga disse que o Centro Acadêmico deveria chamar-se Nelson Rodrigues e não Oswald de Andrade. Melhor, esquerda festiva deve assumir-se festiva.

*************


Estava pensando em Nelson e seu buraco da fechadura. Creio que esteja também, ali, olhando o mundo através do buraco da fechadura. Um tanto menos interessada no que as pessoas fazem na cama, um tanto mais interessada no que as pessoas fazem à mesa.

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Gosto de pessoas, mas não sei aproximar-me delas. Tenho medo de chegar e dizer um simples "oi". Tenho medo, porque sei que eu não pararia de falar se ela desse um sorriso convidativo. Preciso desses territórios sem fronteiras para conseguir me aproximar, mas abuso. Sou abusada. É isso.
Ainda bem que as palavras podem significar outra coisa daqui a alguns anos. Assim como os seres humanos.

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Enjoy Active.
Escrevi isso nunca camiseta hoje. Pronunciando rápido e aportuguesado dá outro adjetivo bom para minha qualificação.

*************


Finalizando a paranóia

Por que há tantos poetas homens e tão poucas poetas mulheres, se homem sempre diz que não gosta de poesia?

Por que na literatura de língua inglesa, especialmente na Inglaterra, há mais mulheres incluídas entre os grandes nomes da literatura e no resto do mundo é tão difícil lembrar de um nome feminino?

Por que o Rock in Rio em Lisboa não se chama Rock in Lisbon?

Será por essas coisas de português que Pessoas preferiu nacionalizar-se falante do português e não português?

domingo, maio 09, 2004

Recordar é viver:

Eu ia fazer outro poema para minha mãe, mas estou com Wittgeinstein na cabeça então vai um que publiquei em setembro, ou outubro, não lembro direito.

Canção para minha mãe

Mãe
nome que me deste
fazendo da troca
por vezes
meu papel inevitável

Mãe
A parte de mim
saída de ti
numa gestação
improvável

Mãe, tu és.
És minha filha, minha amiga
És mãe, minha sina
a gota de leite
no café da esquina
O sorriso pendente
na boca de tua menina.

Mãe
A fôrma da força
A forma da chuva
na nuvem que desenha o céu
Trovões enfeitando a voz
raios que contornam o véu
sobre a cabeça que sustenta os pés

Mãe, tu és
És minha filha, minha amiga
és mãe, minha sina
A gota de leite
no café da esquina
O sorriso insistente
na minha boca,
Tua menina.

quinta-feira, maio 06, 2004

Diário de Bordo SP destino Belém, Campinas, Macaé, Rio de Janeiro, Contagem, Porto Alegre e Vila Velha.

Isso era um post pelo aniversário do meu lindo lindo, mas apaguei porque achei melhor mandar por e-mail. Ah, é tão mais legal receber um e-mail em que o único destinatário é você, não é mesmo? Coisa pública fica de todo mundo e meus agradinhos são só para ele. É o dia dele, afinal.

***


E amanhã isso aqui faz um ano de retorno. Um anito de brógue. Parabéns para ele e para vocês que conseguem ler minhas bobagens. Diria "Chatomino": absurdinho!

***


Sou alergécia a formigas e uma me mordeu bem na orelha. Como se não bastasse, o moço da farmácia 24h foi passando um remedinho e eu perguntei:
- O que é isso?
- É merthiolate.
Eu tenho alergia também!
A orelha está uma coisa.
E eu já estava "pirata" sem navio, tesouro e papagaio - tersol! E agora a orelha. Tudo acontecendo nesse corpo.
No mais tudo ok, exceto a semana "lerê lerê" que me aguarda: prova na educação, seminário de LBV e muito papo de mulher. Muitas mulheres loucas e penso em incluir K.Mansifield entre elas. Ainda não sei, são só devaneios, concentro-me mesmo na Paloma Glen Close da Ana C.
Se eu demorar a voltar, não se preocupem, muita coisa para ler e pouco tempo para pensar em escrever. Acho que a fase deserto deu uma passada, estou cheia de inspirações e "suspirações".
Té mais ler.

quarta-feira, maio 05, 2004

Odiário

Eu odeio o silêncio
por me fazer odiar a palavra
Odeio o computador
por me fazer ser só palavra
Odeio a literatura
que me faz odiar a mim mesma
por ser só
ser
palavra.

As coisas que beijei e não vivi

Creio que tudo está virando carta neste momento em que exorcizo um ponto obscuro da minha vida. A paixão inicial que se transformara em obsessão, hoje não passa de uma necessidade para me livrar de quatro frustrações, pontos que marcam uma divisão de olhar.
A cada segundo que passa tenho medo de chegar aos 30 anos, devo confessar, embora faltem poucos dias para isso. Estou com medo de envelhecer, medo da passagem dos anos e das horas.
Não é uma questão estética, não me importo com a lei da gravidade. Se meus seios não estarão firmes, se minha bunda cairá, ou mesmo se terei rugas e nenhum homem se interessará por mim. Nada disso me importa, nunca me considerei uma mulher bonita e atraente.
A única que vez em que um homem elogiara exaustivamente meus dotes físicos, contrariou-me tanto que sentia-me como um pedaço de carne, pronta para o abate, mesmo fazendo um esforço enorme para que ele só me enxergasse assim.
O medo dos 30 anos é maior que os valores sociais, estéticos ou algo do gênero. O medo dos 30 anos nasce de uma obsessão e parece se aproximar o momento de romper com a necessidade da intensidade. Chega o momento em que a dor não tem razão, a tristeza e o pessimismo me enojam. O asco pelo descrédito é tanto que chego a acreditar-me incapaz de enxergar um caminho para fugir do guarda-chuva em céu de brigadeiro. Sinto asco de tudo que construi.
Mulheres entram na minha vida para que eu elimine-as dela.
Um basta em literaturas tristonhas...
Quero uma casa de filme americano, filhos e um marido chegando com pão frequinho para tomar café.
Quero, pela primeira vez, não achar essa cena enfadonha e entediante.

Beijos
Maria da Silva.

PS1 - é tão interessante perceber que um texto em primeira pessoa se faz autobiografia, mesmo não sendo.
PS2 - O dia em que as pessoas descobrirem diferença entre narrador/autor, personagem/pessoa, poeta/eu lírico, acho que acontecerá um suicídio coletivo de intelectuais, leitores de blogs, jornais e "fantes" da vida...

terça-feira, maio 04, 2004

Uma questão que tem me tirado o sono.

Digam , amigos queridos, para esta beduína de vista cansada:

Há realmente esse negócio de universo feminino? Há uma estética literária tipicamente feminina?
As questões não são universais? Há abordagens diferentes entre homens e mulheres que as diferenciem somente pelo sexo do escritor?

Lembrem-se que estou querendo saber, não estou afirmando que não exista. Só quero saber se a diferença na narrativa de uma mulher só se apresenta pelo fato dela ser mulher.

domingo, maio 02, 2004

Words

Axes
After whose stroke the wood rings,
And the echoes!
Echoes traveling
Off from the center like horses.

The sap
Wells like tears, like the
Water striving
To re-establish its mirror
Over the rock

That drops and turns,
A white skull,
Eaten by weedy greens.
Years later I
Encounter them on the road----

Words dry and riderless,
The indefatigable hoof-taps.
While
From the bottom of the pool, fixed stars
Govern a life.


(Sylvia Plath)

Tem a traduação da Ana Cristina César para esse poema, mas não vou colocar aqui não.

sábado, maio 01, 2004

Desculpa aí, tia.

Sem links, eu só tenho uma tia e é para ela que tenho escrito, além de manter conexão direta SP-Belém. Sem esquecer das pessoas que vêm aqui, mas é que esse troço de escrever eu desaprendi. Embrurreci. Antes tinha 3 neurônios, fiquei apenas com um, porque sou uma pessoa singular e ímpar, já disse alguém. Eufemismo para maluca.

Estou mergulhada em cartas póstumas. Estou na encruzilhada das literaturas. Que raio é essa "literatura feminina" que eu não entendo? Escrever para não enlouquecer é coisa de americano bêbado. Clarice resolveu todos esses problemas adolescentes mergulhando na loucura e aproveitando o que há de melhor no enlouquecer literário: a realidade alucinógena.
Como assim de narrativa feminina? "Estilo: Mulher" - isso, para mim, é manchete para caderno de moda de jornal, não para conceituar estéticas, estilisticas, enquadrando as escritoras em rótulos que as unem apenas pelo sexo.
Expliquem-me as datas: escritor bom é escritor morto?
Acho que cansei do pensar literário. Acho que cansei das minhas escolhas. Troca-se tudo por algo que se acredita. Passa alguns anos e deixa-se de acreditar.


Vou ali me afogar em Sylvia Plath.